Uma pátria tem algum sentido
quando é a boca
que nos beija a falar dela,
a trazer nas suas sílabas
o trigo, as cigarras,
a vibração
da alma ou do corpo ou do ar,
ou a luz que irrompe pela casa
com as frésias
e torna, amigo, o coração tão leve.
Frésias. É a segunda vez que vejo estas belas flores serem utilizadas em poemas. Vão muito bem com a “pátria”, ou as “pátrias” que queiramos encontrar no poema do Eugénio.
E porque gosto de frésias, não resisto a transcrever o poema “Frésias” de José Tolentino de Mendonça:
Frésias são flores com cheiro a chá
e ela, aos trinta e sete anos, preferi-as
às flores que se vendem por aí
admitia a beleza mas não o esplendor
porque são tristes as repetições
num instante se tornam saberes
e ela, aos trinta e sete anos,
prezava apenas os segredos que mesmo ditos
permanecem como segredos
(em certas´épocas, por alguma porta esquecida
escapava-se, sonâmbula, para o pátio
que dá acesso à mata
e, por vezes, iam buscá-la
gritando o seu nome ou com a ajuda dos cães
já muito longe de casa
tinha por hábito acender fogueiras
de que, depois, se esquecia
e por isso também os aldeões
a temiam)
nunca compreendeu a natureza da vida doméstica
intensa e aflita criança
incapaz de certezas
o que de mais belo soube
sempre o disse, de repente,
a alguém que não conhecia
Caro Manuel,
Obrigada por trazer até aqui as frésias de Tolentino de Mendonça, é um belo ponto de partida para poder desbravar a poesia de Tolentino, que confesso não conhecer bem.
Boas leituras,
Raquel