Meu casto
e puro amor provinciano,
não percas tempo
acendendo velas
no teu oratório:
nenhum santo
nem eu
estamos na disposição
de fazer o milagre
do teu casamento.
In: Primeiros Poemas (1977)
Meu casto
e puro amor provinciano,
não percas tempo
acendendo velas
no teu oratório:
nenhum santo
nem eu
estamos na disposição
de fazer o milagre
do teu casamento.
In: Primeiros Poemas (1977)
O Sal da Língua, ainda comovido pela beleza das ilhas verdes, regressa com a simplicidade da juventude de Eugénio. O poema escolhido é Paisagem, do livro “Primeiros poemas”.
Entre pinheiros três casas.
Uma azenha parada.
Uma torre erguida
de fraga em fraga
contra o céu de cal.
E um silêncio talhado
para o voo dum moscardo
alastra de casa em casa,
sobe à torre abandonada
e sobre a azenha parada
tomba desamparado.
Onde passou o vento são altas as ervas, e os olhos água só de olhar para elas.
Fonte pura, fonte fria…
(Onde vais, minha canção?)
Fonte pura… assim queria
que fosse meu coração:
fluir na noite e no dia
sem se desprender do chão.
O Outono é isto –
apodrecer de um fruto
entre folhas esquecido.
Água escorrendo,
quem sabe donde,
ocasional e fria
e sem sentido.
Era um amieiro.
Depois uma azenha.
E junto
um ribeiro.
Tudo tão parado.
Que devia fazer?
Meti tudo no bolso
para não os perder.
Noite aberta.
A lua tropeça nos juncos.
Que procura a lua?
A raiz do sangue?
Um rio que durma?
A voz delirando
no olival, exangue?
Sonâmbula,
que procura a lua?
O rosto da cal
que no rio flutua?
Tinha um cravo no meu balcão;
veio um rapaz e pediu-mo
– mãe, dou-lho ou não?
Sentada, bordava um lenço de mão;
veio um rapaz e pediu-mo
– mãe, dou-lho ou não?
Dei um cravo e dei um lenço,
só não dei o coração;
mas se o rapaz mo pedir
– mãe, dou-lho ou não?
O amor
é uma ave a tremer
nas mãos duma criança.
Serve-se de palavras
por ignorar
que as manhãs mais limpas
não têm voz.