Tu estás onde o olhar começa
a doer, reconheço o preguiçoso
rumor de agosto, o carmim do mar.
Fala-me das cigarras, desse estilo
de areia, os pés descalços,
o grão do ar.
In: Matéria Solar (1980)
Tu estás onde o olhar começa
a doer, reconheço o preguiçoso
rumor de agosto, o carmim do mar.
Fala-me das cigarras, desse estilo
de areia, os pés descalços,
o grão do ar.
In: Matéria Solar (1980)
Este pais é um corpo exasperado,
a luz da névoa rente ao peito,
a febre alta à roda da cintura.
O país de que te falo é o meu,
não tenho outro onde acender o lume
ou colher contigo o roxo das manhãs.
Não tenho outro, nem isso importa,
este chega e sobra para repartir
com os corvos – somos amigos.
Setembro: que lugar
para dormir — ou nessas folhas
ardendo pelo chão da tarde.
Como partir, deixar deserta
a casa errante
e diminuta do olhar?
A que nos resta.
Fazer do olhar o gume certo, atravessar a água corrompida, no avesso da sombra soletrar o rosto ardido da sede antiga.
A tarde sacudiu as suas crinas, as crianças demoram-se nos espelhos, um amigo começa no verão, no íntimo despir das suas luzes.
Toar um corpo e o ar e a língua da neve. Toar a erva mortal e verde de cinco noites e ao mar. Um corpo nu. E as praias fustigadas pelo sol e pelo olhar.
Eu vi essas muralhas ruírem sobre o rio — eram calmas as águas de setembro, e sucessivas. Despedia-me das folhas, também eu preparava esse abandono da cidade e das suas almas. Eu vi essas muralhas. Eram espessas broncas frias. Ruíram, quando as olhava.
Nesses lugares, nesses lugares onde o ar perde a mão, os meus amigos começam a morrer. Falar tornou-se insuportável. Falar dessa luz queimada. deserta. Que fazer desta boca, do olhar, tão perto outrora de ser música?
A mão, a terra prometida cada vez mais distante, só a mão sabe ainda o caminho. Um corpo não é casa da tristeza e eu sempre pousei à entrada da pedra do verão. Ó pedra pedra — pedra de alegria. Exasperada.
A manhã parada. O azul. A fundura da pupila. Não é ainda a sede, a matilha, a febre. O tronco nu — a luz vacila.